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Redução da regressividade tributária: uma forma de combater a desigualdade de gênero

13 de maio de 2024

Redução da regressividade tributária: uma forma de combater a desigualdade de gênero

Aprovada no fim de 2023, a reforma tributária sobre o consumo pretende levar simplicidade, transparência e justiça tributária ao consumidor e incentivar a defesa do meio ambiente. Thiago Amaral e Nicolle Robles, sócio e advogada da área tributária do Demarest, ainda destacam outro objetivo: a redução da regressividade tributária.

O termo se refere a uma cobrança de tributos que impacta mais as pessoas que recebem menos, uma vez que, no sistema tributário brasileiro, predomina a tributação sobre consumo em comparação à tributação sobre renda e patrimônio – no entanto, todos os cidadãos consomem. Ao propor a redução da regressividade tributária, “o sistema tributário deverá reduzir os impactos negativos dos tributos sobre pessoas de baixa renda”, explicam os advogados.

Leia também: Reforma tributária: o que é e quais mudanças prevê

Regressividade tributária e desigualdade de gênero

Observando o cenário socioeconômico brasileiro, a situação das mulheres as coloca como mais vulneráveis à pobreza.

Em relação ao mercado de trabalho, uma pesquisa FGV-Ibre mostra que a remuneração dos homens foi 28,3% superior à das mulheres no 4º trimestre de 2022. Além disso, é comum que atividades ligadas à força de trabalho feminino sejam intermitentes e informais, gerando insegurança financeira.

Sobre a vida em família, o Boletim Especial Dieese de março de 2023 mostra que 51% dos lares brasileiros são chefiados por mulheres, sendo que 87% das 12,7 milhões de famílias monoparentais com filhos no país são chefiadas por mulheres. Ademais, são as mulheres que exercem a chamada economia do cuidado, isto é, são cuidadoras não remuneradas dos filhos e de familiares debilitados.

A regressividade tributária, portanto, indiretamente provoca uma cobrança de impostos mais elevada sobre mulheres, reforçando a desigualdade de gênero no Brasil. “Justamente pelas mulheres serem responsáveis pelos cuidados dos filhos, da casa e de pessoas doentes, essas tendem a utilizar sua renda para gastos em consumo de itens básicos, como alimentação, higiene, cuidados pessoais e assistência à saúde, enquanto os homens tendem a dispender sua renda com propriedades e investimentos. Com isso, a carga tributária indireta passa a ser superior em mulheres e pessoas negras”, esclarecem Amaral e Robles.

Como a igualdade de gênero foi abordada na reforma tributária?

Os fatos apresentados anteriormente não foram deixados de lado durante as discussões da reforma tributária, gerando avanços no que se refere à redução da regressividade tributária para as brasileiras.

Redução de alíquotas

Houve a redução das alíquotas para produtos de cuidado à saúde menstrual, e se espera que o mesmo ocorra com produtos de higiene pessoal e de limpeza consumidos por famílias de baixa renda mediante futura regulamentação. Ou seja, além dos absorventes menstruais, a expectativa é que o valor de fraldas infantis e geriátricas, talco, sabonete e pomadas para assaduras também diminua.

As alíquotas de produtos destinados à cesta básica serão zeradas, contudo, ainda não foram especificados quais produtos são esses. “Tal desoneração também ajuda a combater as desigualdades de gênero, na medida em que as mulheres são protagonistas na economia do cuidado, responsáveis, muitas vezes, pela compra de alimentos e bens de primeira necessidade”, complementam Amaral e Robles.

Uniformização de alíquotas

A principal proposta da reforma tributária é a uniformização das alíquotas para todos os produtos e serviços sujeitos aos novos tributos instituídos pela reforma, com exceções constitucionais.

Como desdobramento, espera-se que a prática de pink tax – quando produtos destinados ao público feminino possuem valor mais elevado – deixe de ter conotação tributária, uma vez que não há diferenças entre as alíquotas. Um possível preço mais elevado seria fruto de marketing e estratégia de vendas.

Sistema de cashback

Ainda há uma proposta de criação de um sistema de cashback que, a princípio, consistirá na devolução dos tributos pagos por famílias de baixa renda na aquisição de gás de cozinha (GLP) e no uso de energia elétrica.

Amaral e Robles evidenciam a experiência positiva do estado do Rio Grande do Sul ao instituir o Devolve ICMS, um programa de devolução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços. “Os beneficiários são famílias cadastradas no programa Bolsa Família, e, segundo dados do governo estadual, 83% das famílias beneficiadas possuem mulheres como responsáveis pelos lares. O impacto é positivo na diminuição das desigualdades, com acréscimo de 17% na renda dessas famílias”, informam os advogados.

Uma derrota amarga

No meio de discussões positivas, um ponto desagradou os especialistas. Embora a reforma tributária crie o Imposto Seletivo, um tributo que incidirá sobre produtos, bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, a possibilidade de sua cobrança sobre armas e munições foi retirada do texto final da lei, contrariando a proposta inicial. Considerando que armas de fogo são o instrumento mais utilizado em feminicídios no Brasil, a cobrança de Imposto Seletivo sobre esses objetos seria importante para desencorajar seu uso.

Ainda assim, o cenário de mudanças traz a esperança de que o sistema tributário aja de forma mais justa e equitativa no futuro. Por enquanto, é necessário aguardar a regulamentação das medidas que auxiliam na redução da carga tributária incidentes sobre as mulheres.

Para saber mais sobre a análise de Amaral e Robles, confira seu artigo para o Valor Econômico.

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