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CVM abre consulta pública para aprimorar a regulamentação aplicável às entidades administradoras de mercados organizados
18 de janeiro de 2024
Em 18 de dezembro de 2023, a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) abriu uma consulta pública com proposta de alterações à Resolução CVM 135, de 10 de junho de 2022 (“Resolução CVM 135”), que dispõe sobre mercados regulamentados de valores mobiliários. A consulta pública é voltada, principalmente, aos artigos 44, 45, 46, 152 e 154, os quais disciplinam a participação no capital social de entidades administradoras. A consulta pública ficará aberta para recebimento de manifestações até 15 de março de 2024.
Inicialmente, cabe ressaltar o escopo dos principais artigos objeto da nova consulta pública aberta pela CVM. O art. 44 da Resolução CVM 135 estabelece que a aquisição de participações superiores a 15% do capital social com direito a voto de entidades administradoras depende de autorização prévia da CVM, enquanto o art. 45, por sua vez, veda a detenção de mais de 10% do capital social com direito a voto por participante de mercado organizado sob responsabilidade da respectiva entidade administradora.
No caso de descumprimento dos artigos mencionados anteriormente, o art. 46 determina que deve haver limitação nos direitos de voto inerentes às participações no capital social que excederem o percentual de 15%, sendo que tal limitação deve ser estabelecida no estatuto social da entidade administradora.
Ademais, nos casos de entidades administradoras de mercado de balcão organizado, o art. 152 afasta as limitações previstas nos artigos 44 e 45 quando cumpridos os requisitos destinados a assegurar o tratamento de conflitos de interesse, a segregação de atividades e o poder de polícia da CVM sobre acionistas, administradores e participantes.
Por fim, o art. 154 estabelece os aspectos a serem considerados pela CVM ao exercer a prerrogativa de fixar limites ao exercício do direito de voto de entidade administradora de mercado de balcão organizado, bem como os requisitos de independência aos administradores da entidade administradora.
O objetivo da CVM, por meio da consulta pública, é avaliar a possibilidade de flexibilização das restrições à aquisição de participação no capital social de entidades administradoras. Como embasamento das pesquisas, foram solicitadas as seguintes informações às entidades administradoras em relação ao tema:
- pertinência da manutenção do regime atual de limitar a posição que um participante de mercado organizado pode deter no capital social votante da entidade que administra o mercado organizado em questão;
- adequação do limite de 10% vigente nos casos descritos no item (i) acima, com indicação de eventual percentual alternativo considerado adequado bem como o critério utilizado para determiná-lo; e
- introdução de mecanismos para mitigar conflitos de interesse decorrentes de eventual flexibilização.
Argumentos favoráveis à supressão do limite específico para participantes
Diversas manifestações recebidas nas contribuições técnicas foram favoráveis à revogação do art. 45 da Resolução CVM 135, eliminando a limitação de que participantes detenham mais de 10% do capital social com direito a voto de entidades administradoras nas quais sejam pessoas autorizadas a operar. Dentre os argumentos, destacam-se:
- A manutenção da obrigação de obter uma aprovação prévia da CVM para adquirir participação no capital social com direito a voto da entidade administradora, independentemente de o adquirente ser participante, de acordo com o art. 44 da Resolução CVM 135, com introdução de novos deveres de transparência e de conduta à entidade administradora destinados a lidar com potenciais conflitos de interesses.
- A revogação dos artigos 44 e 45 da Resolução CVM 135, com a substituição de uma sistemática semelhante à sistemática do art. 152 da Resolução CVM 135 para o mercado de balcão organizado, exigindo que a entidade administradora estabeleça:
- regras e procedimentos internos para identificar, prevenir e tratar adequadamente os conflitos de interesse decorrentes das atividades de administração de mercado;
- mecanismos de segregação de atividades, vedando a existência de administradores empregados e prepostos comuns à entidade administradora e ao participante; e
- instrumentos legais que assegurem o exercício do poder de polícia da CVM sobre os acionistas, administradores e participantes.
Na esfera infralegal, os principais argumentos favoráveis à revogação do art. 45 da Resolução CVM 135 abarcam a redução das barreiras de entrada à concorrência entre entidades administradoras, o alto grau de maturidade do mercado de capitais brasileiro para lidar com potenciais conflitos de interesse e a assimetria regulatória entre os mercados organizados de bolsa e de balcão.
Argumentos contrários à supressão do limite específico para participantes
Os argumentos contrários à supressão do limite específico para participantes consistem na amplitude dos deveres atribuídos às entidades administradoras com relação aos participantes, evidenciando a necessidade de preservação da entidade administradora contra a ingerência excessiva de seus participantes para proteger o funcionamento ordenado e eficiente dos mercados.
Além disso, outro argumento contrário que já havia surgido no edital de audiência pública SDM nº 06/07 trata do surgimento de potenciais conflitos de interesse. Esse argumento é constituído a partir da ideia de que tais conflitos persistem na configuração atual do mercado de valores mobiliários. A depender da proporção da participação acionária mantida, o participante poderia exercer influência sobre as decisões operacionais e institucionais da entidade administradora, abrangendo tanto a formulação e a aplicação das regras de funcionamento do mercado organizado, como as decisões sobre criação, alteração e extinção de produtos e serviços.
Com base nisso, a supressão do limite específico para participantes poderia potencializar o risco de favorecimento comercial dos acionistas em detrimento dos demais participantes, uma vez que precipitaria a constituição de um mercado organizado de bolsa administrado por um único participante, ou grupo de participantes, detentores do capital social da entidade administradora.
Para evitar tais conflitos de interesse, os argumentos contrários à supressão defendem um aumento de supervisão pelo regulador, o que acarretaria a elevação do custo regulatório das entidades administradoras e o incremento da demanda sobre os recursos humanos e materiais do regulador.
Proposta de alteração normativa
Diante do comparativo com as jurisdições internacionais bem como dos argumentos favoráveis e contrários, a CVM propôs:
- a substituição da limitação absoluta aplicável a participantes, prevista no art. 45, pela sistemática de definição de limiar de participação, a partir da qual se precipita o dever de buscar aprovação do regulador, similar ao previsto atualmente no art. 44;
- a adoção de limiar único de 15%, aplicável a participantes e não participantes que pretendam adquirir participação no capital social de entidade administradora; e
- a inclusão de condicionantes mínimas à aprovação prévia pela CVM nos casos de aquisição de participação em capital social de entidade administradora por participante do mercado organizado.
A sugestão é que os artigos 44 e 45 da Resolução CVM 135 sejam reformulados. O art. 44 passará a estabelecer o limite de 15%, que gera a necessidade de aprovação prévia da CVM e a elencar as entidades, pessoas e os valores mobiliários que devem ser considerados no cômputo da participação detida. Enquanto isso, o art. 45 passará a versar sobre os elementos mínimos que serão considerados na análise da CVM para concessão da autorização de que trata o art. 44, inclusive os elementos adicionais que serão exigidos caso o detentor da participação seja um participante do mercado organizado.
Com relação à eliminação do limite de participação no capital social das entidades administradoras por participantes e a adoção da sistemática de aprovação prévia em caso de superação do limiar de 15%, a CVM sugeriu adotar uma proteção objetiva para fins de prevenção de conflitos de interesse. Com isso, os participantes não poderão manter vínculo com nenhum membro do conselho de administração, independentemente do percentual de participação detido no capital social da entidade administradora. O conselho de administração poderá seguir com membros não independentes, desde que não mantenham vínculo com participantes dos mercados organizados.
Ademais, a CVM estabeleceu que é dever da entidade administradora manter o equilíbrio entre os interesses próprios e o interesse público para preservação do adequado funcionamento dos mercados organizados, conforme previsto no art. 14 da Resolução CVM 135, que também passa a ser aplicável aos acionistas relevantes.
Com essas alterações, a CVM acredita que será possível flexibilizar as regras relativas à participação no capital social de entidade administradora por participante do mercado organizado, preservando as salvaguardas que sustentam o acesso e o tratamento equitativo de participantes, bem como o adequado funcionamento dos mercados organizados.
Aprovação prévia de outras atividades exercidas por entidades administradoras
Esse tema é regulado pelos artigos 11, 12 e 184 da Resolução CVM 135. O atual regime estabelece que o exercício das atividades das entidades administradoras elencadas nos incisos do art. 11 independe de prévia e expressa manifestação da CVM, e que o exercício de outras atividades pelas entidades administradoras deve ser precedido por autorização da CVM.
O art. 12, por sua vez, restringe a participação no capital de terceiros a sociedades que tenham atividades conexas ou semelhantes, ou seja, os limites à exploração de outras atividades se aplicam ao seu exercício de forma direta e indireta pela entidade administradora, por meio de outras sociedades, controladas ou não.
O art. 184 determina que uma deliberação acerca do exercício das novas atividades é matéria sob competência do colegiado da CVM, independentemente da natureza dessa nova atividade, diretamente pela entidade administradora, seja por meio de outras sociedades, controladas ou não.
Com isso, o resultado foi a submissão ao colegiado da CVM de casos de aquisição pela Brasil, Bolsa, Balcão (“B3”) de participação no capital social de três empresas, em operações de nível de risco baixo. Nesses casos, a Superintendência de Relações com o Mercado e Intermediários (“SMI”) avaliou que os riscos decorrentes da operação haviam sido devidamente identificados e que os mitigadores desses riscos eram adequados. Por essa razão, justifica-se uma alteração na Resolução CVM 135 para prever a substituição da necessidade de autorização, em todos os casos, por uma notificação prévia, após a qual a SMI, em decisão fundamentada a cada caso específico, poderá condicionar o início da nova atividade ou a efetivação da aquisição societária à aprovação pelo colegiado da CVM.
Aprovação prévia de normativos de entidades administradoras e de depositários centrais
Os dispositivos que regulam esses temas (artigos 180 a 184 da Resolução CVM 135) estabelecem a necessidade de autorização prévia da CVM para uma série de atos praticados por entidades administradoras, além de regulamentarem o procedimento aplicável à forma e ao conteúdo do pedido de aprovação prévia, os prazos para análise do pedido pela SMI, e os casos em que a autorização prévia deve ser objeto de deliberação pelo colegiado da CVM.
Dessa forma, foi proposta a distinção dos temas passíveis de prévia aprovação para que apenas determinados documentos e alterações significativas sejam previamente aprovados pela SMI ou pelo colegiado da CVM, conforme o caso.
Mudança no rito de Mecanismos de Ressarcimento de Prejuízos – (“MRP”)
O MRP visa, principalmente, assegurar aos investidores o ressarcimento de prejuízos decorrentes de ação ou omissão de entidades participantes de mercado organizado de valores mobiliários, em relação à intermediação de operações realizadas em tais mercados ou ao serviço de custódia de valores mobiliários, nas hipóteses elencadas no art. 124 da Resolução CVM 135.
A experiência mais recente da CVM na apreciação de recursos sobre decisões denegatórias do MRP fez com a entidade passasse a considerar uma possível alteração no rito para os recursos das decisões do MRP, em conformidade com a concentração da instância recursal nas entidades responsáveis por manter os MRPs, acompanhada de ajustes nas atividades de supervisão da CVM. O objetivo seria buscar o aprimoramento do procedimento e a proteção do investidor, uma vez que os recursos interpostos passariam a ser analisados e julgados pela mesma entidade, preservando o direito ao contraditório e à ampla defesa da reclamada.
Nosso time de Mercado de Capitais está à disposição para esclarecer os tópicos aqui discutidos, bem como fornecer informações adicionais sobre o tema.