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Covid-19 (Novo Coronavírus): M&A e Combinações de Negócios
17 de março de 2020
A pandemia do COVID-19 (Novo Coronavírus), conforme divulgada pela OMS, poderá gerar impactos na implementação de operações de fusões e aquisições (mergers and acquisitions), joint ventures e combinações de negócios em geral (em conjunto, “M&A”), com possível interferência nas datas de signings e closings, além do aumento do gap de avaliação ou precificação de ativos.
Os principais impactos jurídicos que antecipamos são:
A. Extinção ou modificação de obrigações
As partes envolvidas em operações de M&A devem analisar o escopo e a abrangência de cláusulas que possam eximir uma das partes (ou ambas) do cumprimento de obrigações contratuais, extinção de relações contratuais, e/ou que permitam a modificação de condições do negócio pactuado.
Em particular, cláusulas que contêm o conceito de “efeito adverso relevante”, “alteração adversa relevante” e similares buscam atribuir algum nível de flexibilidade a uma parte, ou a ambas, geralmente entre o momento em que os contratos são celebrados (signing) e a sua conclusão (closing).
Em geral, costuma ser do interesse dos compradores ou investidores a faculdade de se valerem destas cláusulas para poderem rescindir o contrato de M&A antes do fechamento, em caso de eventos extremos e excepcionais que comprometam o racional da operação, ao passo que vendedores ou sociedades investidas objetivam limitar, ao máximo, sua extensão, tanto em relação à abrangência quanto ao aspecto temporal. Recomendamos, assim, que esta parte do contrato seja objeto de avaliação atenta e que as cláusulas reflitam, no detalhe:
i. o risco alocado;
ii. as situações em que elas se aplicam;
iii. as exceções de sua aplicação; e
iv. a solução caso haja divergência sobre a relevância do evento.
Igualmente importante a identificação acerca da necessidade de notificação entre as partes da ocorrência de algum evento que possa impactar o fechamento da operação.
B. Preço e indenização
A precificação de ativos e os mecanismos de aferição de risco alocados a cada parte tendem a ocupar papel cada vez mais relevante, neste cenário em que os impactos econômicos do COVID-19 são de difícil quantificação.
Em operações em que há o decurso de tempo entre o signing e o closing para cumprimento de alguma condição ao negócio, os critérios de assunção ou mitigação de riscos associados à variação de preços abrupta deverá ser claramente descrita. Eventos extremos como o COVID-19 impõem à economia mundial uma retração e impactam os índices de consumo dos produtos e serviços , bem como causam redução de valores de mercado de ativos e uma forte oscilação do preço de câmbio entre moedas. Tudo isso pode gerar uma retração material do fluxo de caixa, recebíveis e do valor dos ativos de empresas.
Nos casos de signing e closing em momentos diferentes, a ocorrência dos casos acima podem ser tratados como “efeito adverso relevante” já comentado acima ou, a depender da negociação, as incertezas são tratadas por meio de mecanismos de indenização, que se submetem a regras de prescrição/decadência, grau de previsibilidade de eventos futuros pelo comprador e limite de indenização (cap) fixado contratualmente.
Em qualquer caso, espera-se maior escrutínio nos processos de diligência (due diligence), por compradores/investidores e vendedores/sociedades investidas, e na redação das chamadas declarações e garantias prestadas, principalmente aquelas ligadas à descrição dos ativos das empresas. Estes aspectos poderão ser fundamento para modificação de preço ou criação de regras para indenização após a conclusão do negócio.
C. Instrumentos e estruturas alternativos; funding
Em um cenário com maior incerteza, a discussão sobre preço e sua variação pode se mostrar mais desafiadora. Adicionalmente, a depender do nível de exposição do comprador/investidor a determinada jurisdição ou indústria, é possível que se busque, antes do signing, reduzir o volume de recursos a ser desembolsado, seja por meio da diminuição do percentual de participação, ou da simplificação de determinados direitos atribuídos ao novo sócio.
É importante avaliar, ainda, em M&As que dependam de financiamento, o impacto e a abrangência das cláusulas que regem a extinção de relações contratuais, tornam inexigíveis determinadas obrigações e/ou permitem a modificação de condições do negócio pactuado (e.g. resilição voluntária ou involuntária, market flex, efeito adverso relevante, dentre outras).
Nestes casos, pode-se alterar-se o instrumento de investimento para alocar o risco desta incerteza, total ou parcialmente. A utilização de instrumentos alternativos como ações resgatáveis, debêntures conversíveis ou participativas, ou ainda bônus de subscrição, pode ser mecanismo útil para se chegar, no tempo, à atribuição mais adequada de valor conforme se materializarem os evento que, ao tempo do contrato, são incertos.
D. Caso fortuito e força maior
Assunto correlato aos pontos indicados acima, mas distinto na essência, diz respeito a casos fortuitos e força maior. Ao contrário de outras jurisdições, que atribuem exclusivamente às partes contratantes as regras acerca de force majeure, a lei brasileira indica, no art. 393 do Código Civil, que o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por ele responsabilizado.
Em um M&A, as relações são bilaterais e surge a questão a quem se atribuir a responsabilidade pela alteração do pacto em razão destes eventos. Nestes casos, em vez de se atribuir a responsabilidade de forma genérica a uma das partes, opta-se, em geral, por circunscrever determinados eventos e atribuir a responsabilidade a determinada parte, com impactos seja no preço (se ocorrerem entre signing e closing), ou em eventos de indenização (ou de isenção do dever de indenizar).
De qualquer forma, em que pese jurisprudência que afastou a aplicação da teoria da imprevisão em casos onde a alteração de condições econômicas, a avaliação acerca do enquadramento das consequências do COVID-19 em casos fortuitos, força maior ou teoria da imprevisão deve ser feito caso a caso.
E. Diligência adicional
Recomendamos documentar e monitorar os esforços realizados para a execução do contrato e como a pandemia do COVID-19 afetou particularmente sua habilidade de execução contratual.
Assim, para comprovar a boa fé e higidez para configuração de eventos que impactam os contratos de forma mais relevante, inclusive eventos de força maior, os esforços preventivos para mitigar riscos serão importantes para tribunais judiciais na determinação de se:
i. passos razoáveis foram tomados; e
ii. a execução das obrigações contratuais era realmente impossível. Nesse contexto, é importante, também, manter o controle sobre medidas adotadas por autoridades, em especial restrições a determinadas atividades.
F. Companhias abertas
Negócios que envolvam companhias abertas apresentam desafios adicionais aos descritos acima, sobretudo se suas ações forem listadas e, em particular, se parte ou totalidade da contrapartida estiver representada por estas ações, tanto em operações primárias (aumento de capital), quanto secundárias. Neste caso, recomenda-se a criação de limites contratuais de tolerância na volatilidade da cotação, ou ainda a elaboração ou atualização de laudo ou fairness opinion por avaliador com comprovada experiência para reduzir a relevância da cotação no estabelecimento de relações de troca.
Adicionalmente, para combinações de negócios que envolvam mecanismos de oferta pública – de aquisição ou distribuição -, recomendamos a avaliação sobre a necessidade de eventuais modificações em seus termos e condições, tendo em vista a regra geral sobre a irrevogabilidade de ofertas públicas, exceto por efeitos decorrentes de alteração substancial, posterior e imprevisível nas circunstâncias.
Por fim, pode ser interesse da companhia negociar com suas próprias ações, antes ou após a conclusão do negócio. Esta negociação é regulamentada pela CVM, que cria limites quantitativos, financeiros e temporais. Informações adicionais sobre o impacto do COVID-19 em companhias abertas estão disponíveis neste link.
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