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Client Alert

Boletim de Imobiliário nº1

13 de setembro de 2022

STF Reabre discussões sobre o fato gerador do ITBI

No dia 26 de agosto de 2022, o Supremo Tribunal Federal (“STF”) reabriu discussão sobre tema que havia sido pacificado em fevereiro de 2021, e que estabelecia como fato gerador do Imposto de Transmissão sobre Bens Imóveis (“ITBI”) o registro do título aquisitivo na matrícula do imóvel, transferindo dos notários para os registradores o encargo de verificar o recolhimento.

Na recente revisão, os ministros do STF restabeleceram a dinâmica que vigorava até então, fixando a lavratura de escritura pública como o fato gerador.

Embora seja desejável que o STF evite constantes revisões de uma mesma matéria, é de se reconhecer que a decisão reformada, sob o ponto de vista da prática notarial e registral, não havia ganhado efetividade.

Isso porque, embora tivesse afirmado o registro da transferência como fato gerador, não havia sido suficiente para reformar a chamada lei dos notários e registradores que atribui ao tabelião a responsabilidade de verificar o recolhimento regular de tributos de transferência no momento da lavratura da escritura, assim expondo-o a penalidades. Tampouco havia alcançado a legislação municipal que disciplinava a incidência, alíquota e fato gerador dos tributos locais, como o ITBI.

Com isso, e à exceção de alguns poucos casos de que se tem registro, as escrituras lavradas entre fevereiro de 2021 e agosto de 2022 contaram com o recolhimento prévio do ITBI, salvo exceções legislativas pontuais (como, por exemplo, no caso de escritura lavrada em município diverso do imóvel). Em casos especiais, com o amparo de ordens judiciais, essa efetividade se fazia presente, no entanto, ao analisarmos a repercussão de tal iniciativa recente do STF.

Vale pontuar que a tese anterior era considerada mais bem alinhada à regra civil para a transferência de propriedade imobiliária, que, de fato, só ocorre com o registro de títulos aquisitivos. Se essa tese tivesse sido aplicada de forma continuada, também haveria o benefício de se padronizar o momento de recolhimento de ITBI em relação a todos os títulos aquisitivos.

Se, pela legislação atual, a outorga de escritura marca o fato gerador, a aquisição da propriedade imobiliária por títulos particulares (e.g., integralização de capital, consolidação de propriedade em excussão de garantia) tem o recolhimento do ITBI diferido para o momento do registro.

Essa falta de padronização não apenas abre o caminho para mais revisões da matéria, como expõe um hiato que por vezes se faz presente no diálogo entre direito imobiliário, tributário e prática cartorária.

Não à toa, a recente revisão foi proferida no cerne de um processo que discute outro ponto do ITBI: sua incidência ou não sobre a cessão de direitos aquisitivos sobre promessas de compra e venda não registradas.

Embora a análise desse tema pelo STF seja recente, a discussão é antiga e também se ergue sobre os mesmos fundamentos de fato gerador. Neste processo, em lugar de se discutir o momento, debate-se a hipótese de a cessão ser suficiente para caracterizar a transferência da propriedade imobiliária.

De fato, o tema demanda uma pacificação veloz.

Nosso escritório segue acompanhando a evolução do caso.

 

Projeto de lei para os Trusts

O Projeto de Lei nº 4.758/2020, em fase final de tramitação, de autoria do Deputado Enrico Misasi, pretende introduzir no direito brasileiro o instituto da fidúcia, um negócio jurídico pelo qual o fiduciante entrega bens ao fiduciário para que os administre em nome de um terceiro, chamado beneficiário.

Essa dinâmica tripartite dura enquanto não se alcance determinada condição resolutiva (de prazo ou de obrigações), que superada, autoriza a transferência do bem em caráter definitivo para o beneficiário. Muito utilizados no exterior, os trusts têm a mesma roupagem da fidúcia e inúmeras aplicações.

No Brasil, os trusts prometem entrar no rol de garantias, ampliando as fronteiras da taxatividade. Nessa aplicação, se tornarão muito parecidos à alienação fiduciária em garantia.

Nesse caso, fiduciário e beneficiário se concentram em uma só pessoa e as normas da Lei de Alienação Fiduciária em Garantia se aplicam subsidiariamente. No entanto, pode haver uma diferença fundamental: apesar da subsidiariedade, não está claro se haverá necessidade de que a quitação da dívida seja feita por meio de leilão, o que abre caminho para que o credor possa ficar com o bem em quitação da dívida. Também não está claro de que forma seria feita a apuração de valores para fins de extinção dessa dívida.

Para além dos imóveis, é preciso compreender que essa modalidade de garantia poderá recair também sobre bens móveis e semoventes, sem demandar necessariamente a tradição que se requer no penhor, mas encarregando o fiduciário-beneficiário-credor de se incumbir da administração zelosa desses bens, de forma que não se deteriorem e que sua garantia permaneça íntegra.

Ainda é cedo para dizer, mas a fidúcia como modalidade de garantia pode expandir os tipos de lastro que são utilizados em operações financeiras, sempre mantendo-se a excussão da garantia no âmbito extrajudicial, de fundamental importância para sua efetividade.

Igualmente fundamental é o destacamento do patrimônio do devedor, de forma a assegurar a garantia contra situações de estresse acentuado. Possivelmente, uma relevante aplicação seja no agronegócio, que usa financiamento para a aquisição e aluguel de máquinas e colheitadeiras, em quantidade e valores elevados.

Uma outra aplicação para os trusts, muito conhecida no exterior, é o planejamento sucessório. Esse instituto pode ser utilizado para os casos em que os ascendentes pretendam reservar aos descendentes determinados bens imóveis, mas deixando-os acessíveis aos beneficiários apenas quando esses descendentes atingirem a maioridade ou determinada condição.

O emprego da fidúcia, nesses casos, pode evitar uma doação indesejável a menores, que limita a administração dos bens ao impedir que sejam vendidos pelos ascendentes sem autorização judicial.

Também pode reduzir a constituição de cláusulas de inalienabilidade e incomunicabilidade, adiando a transferência para o descendente para o momento em que o bem possa ser plenamente usufruído. Ademais, pode ser uma alternativa à constituição de holdings familiares, que por vezes trazem formalidades que, embora pouco complexas, desafiam a dinâmica familiar. Portanto, pode se apresentar como um eficaz mecanismo de planejamento sucessório.

Seja qual for a aplicação, o Projeto de Lei nº 4.758/2020 exige, conforme se vê em sistemas jurídicos estrangeiros, que haja destinação do bem a uma determinada finalidade, com a separação do restante do patrimônio do fiduciário. Dessa forma, cobra-se do fiduciário a diligente administração remunerada da garantia, mas não se permite que receba os frutos que dela vierem.

Embora o Projeto de Lei nº 4.758/2020 não tenha tratado do aspecto tributário, é possível que seja similar ao da alienação fiduciária em garantia no momento da constituição da fidúcia.

Ainda assim, haverá dúvida sobre qual tratamento tributário será aplicado no momento da consolidação da propriedade do bem em nome do beneficiário, tanto para beneficiário quanto para fiduciante.  Para as dúvidas que hoje existem, resta o acompanhamento da iniciativa.

O Projeto de Lei nº 4.758/2020 foi aprovado pela Câmara dos Deputados e seguirá para tramitação no Senado. Se aprovado, seguirá para sanção presidencial.

 

Corretores de Imóveis

De vida curta, o Decreto nº 11.165/2022 publicado no último dia 09 de agosto de 2022, criava um novo marco regulatório da profissão de corretores de imóveis e trazia a polêmica extinção da necessidade de inscrição junto ao Conselho Regional de Corretores de Imóveis (“CRECI”) para a intermediação de transações patrocinadas por pessoas jurídicas.

No entanto, o que mais chamou a atenção não foi a mudança legislativa, mas sim o fato de que ela foi revogada horas depois de sua publicação, por uma forte mobilização de corretores.

Ainda assim, esse episódio demanda revisitar o entendimento sobre órgãos de classe. Se, por um lado, eles têm como objetivo a organização da profissão, por outro, pretendem orientar o público em geral sobre as pessoas habilitadas a prestar serviços especializados.

Talvez as alterações na forma de se comercializar imóveis, utilizando sites e com o ingresso de startups voltadas para esse segmento, tenham contribuído para tornar essa profissão acessível a um maior número de pessoas.

Leia mais no artigo publicado em 16/08/2022 por Marc Stalder no Migalhas.

 

Evento

No dia 24 de agosto de 2022, o time de imobiliário do Demarest Advogados realizou o evento “Os impactos na lei do registro eletrônico nos negócios”, durante o qual Silvio Venosa, Marc Stalder, Flávia Vidigal, Flaviano Galhardo, Fernando Blasco e Robson de Alvarenga se reuniram para discutir a Lei nº 14.382/2022.

Confira a íntegra do evento clicando aqui.

 

Mudança de Uso de Edificações

Publicada no Diário Oficial da União de 13 de julho de 2022, a Lei nº 14.405/2022 alterou o art. 1.351 do Código Civil, para reduzir o quórum para a aprovação da alteração de uso de condomínios edilícios (verticais), de sua totalidade para apenas 2/3 (dois terços) dos condôminos.

Com isso, os condomínios que hoje são exclusivamente residenciais poderão ter parte ou totalidade das unidades autônomas convertidas para uso comercial.

Na prática, no entanto, a medida mira o aproveitamento de lajes comerciais que ficaram subutilizadas com a consolidação do trabalho híbrido ou remoto e que podem ser convertidas em unidades residenciais, conferindo-se, assim, maior flexibilidade ao uso do imóvel e otimizando seu aproveitamento.

Embora a medida possa, de fato, abrir caminho para um novo uso de antigos espaços de escritórios, a Lei nº 14.405/2022 é apenas um pequeno passo à frente no caminho de um enorme desafio de reurbanização de áreas e ressignificação de espaços urbanos.

Embora capitais como Belo Horizonte mesclem bastante espaços comerciais e residenciais dentro de um mesmo bairro, o Rio de Janeiro quase não conta com unidades residenciais no chamado centro da cidade. Com isso, também não conta com equipamentos e serviços urbanos que possam atrair interessados em moradia na região.

Não à toa, inúmeras cidades têm dedicado esforços substanciais no sentido de reverem os planos diretores das cidades. Entre setembro e outubro de 2022, o Rio de Janeiro terá uma intensa agenda de discussões. Já São Paulo também está prestes a concluir os trabalhos de revisão que teriam se encerrado em 2021, não fosse a pandemia de COVID-19.

A empreitada, que parece monumental, é absolutamente necessária à adequação da cidades às novas realidades, não só trazidas pela pandemia, mas também por outros fatores, como a introdução de novos serviços no cenário urbano, a exemplo da mudança que as dark kitchens trouxeram, ou mesmo a utilização de espaços de coworking e coliving.

Nosso escritório está acompanhando as iniciativas e reportará andamentos relevantes.

 

Lançamento do sistema “Sniper”

No último dia 16 de agosto, o Conselho Nacional de Justiça (“CNJ”) lançou o Sistema Nacional de Investigação Patrimonial e Recuperação de Ativos, batizado de Sniper, que pretende permitir que a justiça utilize as bases centralizadas de dados para a apreensão de ativos nos processos de satisfação de créditos.

A ferramenta faz parte do chamado Programa Justiça 4.0 do CNJ, que favorece o uso de tecnologias pela justiça como meio de tornar a prestação jurisdicional mais efetiva.

Com menos de 30 dias de lançamento e ainda em fase de implantação, é difícil dizer qual será exatamente o alcance do Sniper será restrito a processos executivos ou se terá seu uso expandido para uma função investigativa a ser conduzida na fase cognitiva das ações.

Todavia, essa ferramenta vem em linha com mudanças legislativas que procuraram centralizar informações pessoais e dar efetividade a transações, evitando-se, no caso dos imóveis, riscos associados a demandas anteriores às transações.