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Assinatura Eletrônica em Contratos: Alternativa no cumprimento do Distanciamento Social do Covid-19?

27 de março de 2020

Ainda faz parte da realidade brasileira, na conclusão e celebração de contratos, o ritual da reunião derradeira com a presença de advogados, de todas as partes e de seus representantes legais fechados em salas de reunião por horas para assinatura (e rubrica!) de todas as paginas dos documentos contratuais impressos.

Em outras jurisdições, todavia, isso é algo relegado ao passado, havendo a possibilidade do contrato ser aperfeiçoado com a circulação em formato PDF da página de assinatura contendo a assinatura aposta pelos representantes legais das partes ou até mesmo com um “de acordo” enviado por email.

Frente aos riscos à saúde decorrentes de um possível contágio do COVID-19 e às obrigações de distanciamento social que nos são recomendadas neste momento de pandemia, o ato de assinatura de contratos com muitas pessoas reunidas em um único local, especialmente os típicos de operação de M&A, passou a ser um desafio.  

Seria, todavia, indispensável a reunião presencial de todos os envolvidos nessas circunstâncias? A resposta, parece-nos, é que a depender das características do contrato, podemos sim evitar a necessidade de presença física das partes para o aperfeiçoamento contratual. A solução, para estes casos, é lançar mão de assinaturas eletrônicas em documentos digitais.

De maneira geral, as assinaturas eletrônicas referem-se a qualquer mecanismo eletrônico (não necessariamente criptográfico) utilizado para a identificação e vinculação dos signatários, seja por meio de escaneamento de assinatura, impressão digital, assinatura digital ou outros mecanismos eletrônicos existentes.

Desde 2001, com a Medida Provisória 2.200-2, de 24 de agosto de 2001 (“MP 2.200-2”), – ainda em vigor, já que fora editada antes da Emenda Constitucional nº 32 que limitou a validade das medidas provisórias em 60 dias – existe regulação acerca dos requisitos para validade de documentos e assinaturas eletrônicas.

A MP 2.200-2 criou a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras – “ICP-Brasil” que, por meio de sua Autoridade Certificadora Raiz (Instituto Nacional de Tecnologia da Informação – ITI) e de suas Autoridades Certificadoras – “ACs” (emissoras dos certificados digitais), garante a autenticidade, integridade e validade jurídica dos documentos em forma eletrônica.

A MP 2.200-2 estabelece também que as declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários.

Nem todas as empresas e ferramentas disponíveis no mercado brasileiro são credenciadas no âmbito do ICP-Brasil e, portanto, podem em princípio serem juridicamente questionadas no Brasil, tendo em vista que não conferem a presunção relativa de autenticidade atribuída no âmbito da ICP-Brasil, especialmente não sendo a empresa uma “AC” credenciada pelo ICP-Brasil

Há dois aspectos, no entanto, que devem ser salientados em relação à utilização de contratos e assinaturas digitais.

Em primeiro lugar, é preciso levar em consideração a questão da “exequibilidade” de tais instrumentos. Como sabemos, para que um contrato particular pelo qual se pretenda exercer o direito de cobrança de uma dívida se constitua em um título executivo extrajudicial, ainda há necessidade de tal documento ser assinado pelas partes e por 2 (duas) testemunhas.

Há que se questionar se a simples assinatura entre as partes online permite ou não a formação de título executivo, sem a presença de testemunhas. Ocorre que a questão é controversa na jurisprudência brasileira e, assim, cria incerteza para os contratos assinados eletronicamente.  

Em segundo lugar, contratos que exijam forma específica ou dependam de registro público podem estar expostos a contratempos indesejáveis.

Por exemplo, a compra e venda de imóvel sujeita a escritura pública corre o risco de ter seu registro impossibilitado a depender da localidade. Embora o entendimento do 14º Congresso Notarial Brasileiro, realizado em 2007, tenha sido o de recomendar aos notários brasileiros aceitar todos os certificados digitais sob a égide do ICP Brasil para assinatura de documentos públicos notariais, em muitas localidades, essa alternativa ainda não está disponível.

A lavratura de escritura pública digital e assinatura eletrônica/digital depende do entendimento da Corregedoria Estadual e do próprio Tabelionato de Notas, além de efetiva infraestrutura do tabelionato para assinatura eletrônica/digital de documentos. Assim, por exemplo, em São Paulo e Minas Gerais é possível assinar escrituras públicas digitalmente, mas não no Rio de Janeiro, que ainda exige a assinatura “com tinta preta ou azul”.  

A mesma análise deve ser feita em relação a possibilidade de arquivamento de alteração ao contrato social de sociedades limitadas por meio eletrônico. A Lei nº 13.874 de 20 de setembro de 2019, a chamada Lei de Liberdade Econômica, já estabelecia a diretriz para que o estado passasse a adotar exclusivamente documentos eletrônicos. Esta lei foi recentemente regulamentada pelo Decreto Nº 10.278, de 18 de março de 2020. Porém, nem todas as juntas comerciais estão preparadas para trabalharem com documentos digitais. A JUCERJA no Rio de Janeiro, por exemplo, aceita documentos digitais ao passo que a JUCESP ainda não tem ferramentas para isso.

A rigor, a utilização de meios eletrônicos para conclusão de contrato deverá ser precedida por uma análise especifica do caso sempre que houver a necessidade de se contar com a participação de algum órgão público.

Nos casos onde não há a necessidade de envolvimento em algum âmbito de órgãos públicos será necessário avaliar se o instrumento está sendo celebrado por meio de assinatura eletrônica por parte credenciada da ICP-Brasil, conforme lista constante no link a seguir“ https://www.iti.gov.br/images/repositorio/credenciamento/entidades_credenciadas.pdf”, bem como eventual registro na estrutura do ITI (em credenciamento ou AR): “https://estrutura.iti.gov.br/”.

Por fim, é importante que não se deixe de firmar documento declarando estar ciente de que o processo de assinatura eletrônica é complementar e não substitui o processo de assinatura física do papel. Também é adequado o uso de senha pelas partes nas respectivas operações contratadas e a manutenção de arquivos contendo a íntegra dos documentos firmados, de forma a permitir, se necessário, a sua fiel reprodução para apresentação em juízo.