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Ética e boas práticas: entenda a nova lei sobre pesquisas com seres humanos

29 de julho de 2024

Ética e boas práticas: entenda a nova lei sobre pesquisas com seres humanos

Em 28 de maio de 2024, foi sancionada a Lei nº 14.874, que estabelece regras e boas práticas para pesquisas com seres humanos por instituições públicas ou privadas no Brasil e institui o Sistema Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos.  A lei entrará em vigor dia 27 de agosto de 2024, 90 dias após sua publicação no Diário Oficial da União (ocorrida em 29 de maio de 2024).

Foram nove anos de discussão. O texto inicial foi o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 200/2015, posteriormente denominado como PL nº 7.082/17. Seu substitutivo foi aprovado pela Câmara dos Deputados no fim de 2023, originando o PL nº 6.007/2023. Este retornou ao Senado Federal e foi aprovado, com alterações, em 23 de abril de 2024, sob regime de urgência, partindo finalmente para a sanção presidencial.

A expectativa é de que a Lei nº 14.874/2024 venha a contribuir para um ambiente mais regulamentado e claro para a realização de pesquisas clínicas no Brasil.

Tipos de pesquisas envolvendo seres humanos

 

No art. 2º, a lei em questão traz definições de termos que são abordados no decorrer do seu texto. Entre os termos levantados, vale destacar como a norma classifica os diferentes tipos de pesquisas com participação humana, sendo elas:

  • Ensaio clínico: pesquisa clínica experimental com um ou mais seres humanos realizada para avaliar a segurança, o desempenho clínico ou a eficácia de dispositivo médico, medicamento experimental ou terapia avançada;
  • Pesquisa científica, tecnológica ou de inovação envolvendo seres humanos: pesquisa que, individual ou coletivamente, tem interação com o ser humano, de forma direta, sem fins de registro do produto sob pesquisa;
  • Pesquisa clínica com seres humanos: conjunto de procedimentos científicos desenvolvidos de forma sistemática com seres humanos com vistas a:
    1. avaliar a ação, a segurança e a eficácia de medicamentos, de produtos, de técnicas, de procedimentos, de dispositivos médicos ou de cuidados à saúde, para fins terapêuticos, preventivos ou de diagnóstico;
    2. verificar a distribuição de fatores de risco, de doenças ou de agravos na população;
    3. avaliar os efeitos de fatores ou de estados sobre a saúde;
  • Pesquisa com seres humanos: pesquisa que, individual ou coletivamente, tem como participante o ser humano, em sua totalidade ou em parte, e o envolve de forma direta ou indireta, incluído o manejo de seus dados, informações ou material biológico.

Regras para pesquisas com seres humanos

 

Pontuadas as definições, a Lei nº 14.874/2024 estabelece que pesquisas realizadas com seres humanos atendam às exigências éticas e científicas, incluindo:

  • respeito a direitos, dignidade, segurança e bem-estar dos participantes;
  • risco-benefício favorável ao participante;
  • comprometimento com os interesses da ciência e da sociedade;
  • competência e qualificação técnica e acadêmica dos profissionais envolvidos;
  • provimento dos cuidados assistenciais necessários em casos com intervenção; e
  • procedimentos com qualidade técnica e condução da pesquisa seguindo boas práticas clínicas.

Para que isso seja de fato assegurado, as pesquisas devem ser descritas em protocolo, sendo este aprovado por um comitê de ética em pesquisa (CEP).

A respeito dos participantes, é exigida a garantia de participação voluntária, mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). São necessários o respeito à sua privacidade e a confidencialidade de seus dados, resultando no anonimato de identidades e no sigilo sobre informações. Para tal, o local de utilização e armazenamento do material biológico deve contar com sistema de segurança.

A nova lei ainda estimula a participação de representantes de ambos os sexos e de diferentes segmentos raciais, quando isso não gerar qualquer tipo de prejuízo para o andamento da pesquisa.

Importante destacar que não será permitida remuneração ao participante ou concessão de alguma vantagem em virtude de sua participação na pesquisa. Ainda assim, haverá indenização em hipótese de danos sofridos por ele, além de assistência à saúde prestada que se faça necessária frente aos possíveis danos.

A lei também aborda a proteção de participantes com vulnerabilidades, a continuidade do tratamento de participantes após o ensaio clínico, as responsabilidades de pesquisadores e patrocinadores, como proceder em caso de descontinuidade da pesquisa, entre outros temas.

Sistema Nacional de Ética em Pesquisa Clínica com Seres Humanos

 

O Sistema Nacional de Ética em Pesquisa Clínica com Seres Humanos ainda depende de regulamentação pelo Poder Executivo. A lei evidencia que ele se segmentará na instância de análise ética em pesquisa, representada pelos CEPs, e na instância nacional de ética em pesquisa, a qual editará normas regulamentadoras sobre ética em pesquisa, credenciará e acompanhará os CEPs.

Cada CEP deverá ser composto por equipe interdisciplinar, nas áreas médica, científica e não científica, de modo a assegurar que, no conjunto, os membros tenham a qualificação e a experiência necessárias para analisar todos os aspectos inerentes à pesquisa, inclusive os aspectos médicos, científicos, éticos e os relacionados às boas práticas clínicas.

O comitê terá a responsabilidade de conduzir a análise ética de pesquisas a ele submetidas, bem como assegurar os direitos e a segurança dos participantes da pesquisa. Seu parecer deve ser emitido dentro do prazo de 30 dias úteis da data de aceitação da integralidade dos documentos da pesquisa; essa aceitação ou sua negativa deverá ser feita pelo CEP em até dez dias úteis a partir da data de submissão.

Por fim, vale frisar que a nova lei foca na ética em pesquisas, não excluindo a necessidade de monitoramento e inspeção por parte da autoridade sanitária.

A equipe de Life Sciences do Demarest está acompanhando desdobramentos da Lei nº 14.874/2024 e se coloca à disposição para sanar dúvidas.