Depois de muito debate no meio concorrencial e no Congresso Nacional nos últimos 05 anos, o Projeto de Lei nº 11.275/2018 – que traz importantes incentivos às Ações Reparatórias por Danos Concorrenciais (“ARDCs”) – tem chances de ser aprovado em breve. Além da previsão de que aqueles que forem condenados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE por infração à ordem econômica, como cartel, terão que pagar indenização de danos em dobro aos prejudicados, outra novidade que merece destaque é a previsão de que as empresas que firmarem Termo de Compromisso de Cessação (“TCCs”) deverão concordar (por meio da inclusão de uma cláusula compromissória no acordo) em responder pelos danos que causaram em juízo arbitral.
Muito já se questionou sobre a legalidade e a necessidade da imposição de (mais) essa obrigação ao compromissário de TCC[1] e de que forma, na prática, se daria a operacionalização dessa cláusula pelo CADE. Se, de um lado, alguns comemoram a novidade, outros suscitaram a suposta desvantagem que a empresa compromissária teria ao ter que se submeter ao juízo arbitral para responder por esses danos. Houve, no entanto, uma unanimidade: os altos custos envolvidos na arbitragem seriam um desincentivo aos prejudicados pelos cartéis, que continuariam optando por recorrer ao Judiciário.
Diante disso, é importante que possamos desvendar alguns mitos.
Primeiro mito: as arbitragens são favoráveis apenas aos prejudicados pelos cartéis.
É comum que se apontem, como vantagens da arbitragem em relação ao processo estatal, a celeridade, a confidencialidade e a possibilidade de escolha e especialidade dos julgadores. Para os pleitos reparatórios de danos concorrenciais, as vantagens apontadas iriam justamente de encontro aos principais problemas vivenciados quando tais litígios são submetidos à Justiça Estatal, como o tempo de duração dos processos judiciais, a falta de domínio específico dos juízes quanto aos temas discutidos e a própria complexidade das discussões, que envolvem questões jurídicas, econômicas e contábeis. A doutrina, inclusive, aponta que estes problemas explicam a baixa adesão ao private litigation no Brasil[2].
Como, em regra, os procedimentos arbitrais já são concebidos para serem mais céleres que os processos judiciais, as decisões e a participação das partes (no limite do que conseguem consentir) certamente impõem maior celeridade ao procedimento. A celeridade, portanto, é conceito essencial na arbitragem e está intimamente ligada à ideia de efetividade. Outra vantagem normalmente referida é a confidencialidade dos procedimentos, que também decorre de decisão das partes. Assim, a publicidade do procedimento, da decisão e de eventual acordo ficará restrita às partes daquela demanda. Por fim, se a arbitragem está assentada na autonomia da vontade das partes, desta autonomia também decorre a possibilidade de escolha de seus julgadores, segundo critérios de formação, especialidade e reputação no mercado. Disso se extrai, em sentido contrário ao que se vê na Justiça Estatal, que, na arbitragem, a escolha costuma recair em profissionais especializados na matéria em discussão. Quanto ao procedimento, as partes podem também escolher as regras pelas quais ele será processado, reduzindo o tempo, os custos e impondo racionalidade aos atos.
Derrubando o mito: dentro desse contexto, é possível notar que não será apenas o autor da ARDC que se beneficiará da convenção de arbitragem, mas também o réu. Um dos principais benefícios da celeridade é a considerável redução de custos que ela traz às partes (conforme se verá mais adiante). A confidencialidade do procedimento, por sua vez, no caso específico das ARDC´s, é elemento que notadamente interessará a parte que é demandada pelos prejuízos. Com ela, é preservada sua reputação e evita-se a exposição ao mercado e a publicidade negativa aos consumidores e investidores. No mesmo sentido, também deveria ser de interesse do réu que a causa fosse avaliada por julgadores especialistas eleitos pelas partes, evitando-se, assim, uma decisão desconectada do real dano causado – e muitas vezes superior a este, baseada, por exemplo, em presunções (muito utilizadas nesse tipo de ação, haja vista a alta complexidade da matéria e a falta de especialidade do Judiciário no assunto).
Segundo mito: as arbitragens são mais caras que as ações judiciais.
No mesmo sentido, é importante desmitificar a principal das desvantagens comumente apontadas para a arbitragem: o elevado custo dos honorários arbitrais, despesas e custas devidas aos órgãos institucionais. Como referido, a celeridade e a eficiência do procedimento, por si só, já impõem uma economia ou um ganho financeiro às partes. Quanto maior o tempo de processo – arbitral ou judicial – maior serão os custos envolvidos (incluindo os decorrentes de honorários advocatícios contratuais e do contingenciamento da ação, que, normalmente, tem alto valor de causa). Lembre-se que não é incomum que os processos judiciais durem quase uma década, sendo, de outro lado, comum que a duração média dos procedimentos arbitrais não supere os 24 (vinte e quatro) meses[3].
Mas não é só. Na arbitragem pode haver a combinação de que os honorários contratuais serão reembolsados pela parte perdedora, além de todos os outros custos havidos para a defesa de seus interesses. Na Justiça Estatal, a jurisprudência do STJ[4] não tem admitido esse ressarcimento. Quanto aos horários sucumbenciais, a doutrina ainda diverge sobre a sua incidência na arbitragem quando não houver combinação entre as partes. De qualquer forma, fato é que, se existir tal combinação, os valores normalmente não repetem os parâmetros do processo Estatal, tendendo o custo a ser menor. Outro fator de relevante economia é o fato que, na arbitragem, quando houver mais de um autor ou réu, geralmente, haverá divisão das custas totais entre eles, diferente do que ocorre no Judiciário, onde pode ser exigido, por exemplo, de cada réu, que recorre de forma independente, o preparo da apelação. Além disso, a confidencialidade também pode ser um vetor de redução de custos, notadamente ao réu, à medida em que reduz os riscos com custos reputacionais[5].
O exercício de comparação.
A título ilustrativo, propomos abaixo um exercício de comparação[6] de estimativas de tempo e custos envolvidos a partir do ajuizamento de uma ARDC perante o Judiciário do Estado de São Paulo e, em paralelo, a instauração de uma arbitragem, segundo as regras do CAM-CCBC, considerando um valor da causa de R$ 20milhões. Em ambos os casos, deve se considerar que o perdedor arcará com a integralidade das custas e despesas ao final.