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Healthtechs: 5 etapas essenciais para startups atuarem no setor regulado de saúde
25 de outubro de 2023
Não basta ser inovador, é preciso conhecer, aprender e se preparar para as regras do setor
Por Daniel Caramaschi* e Monique Guzzo**
Empreender no Brasil nunca foi tarefa fácil. Mas a empreitada pode ser ainda mais complexa se envolver algum mercado regulado. Frequentemente, observamos startups que simplesmente abrem as portas e começam a trabalhar – considerando somente as “pequenas” burocracias para se abrir uma empresa no Brasil.
Isso nunca deve ser feito por healthtechs e empresas do setor de saúde, um mercado complexo e extremamente regulado. É preciso identificar e entender as barreiras de entrada e as regras do setor antes de começar a investir tempo e dinheiro. Agir ainda durante a fase embrionária do projeto é mais do que necessário para evitar problemas futuros.
Confira este roteiro prático dividido em cinco etapas para orientar startups que pretendem oferecer produtos e serviços regulados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
Adiante, você também encontrará um breve guia sobre os principais deveres, regulamentações e penalidades relativas a essas agências.
5 etapas para o desenvolvimento de healthtechs
1. Identifique o tipo societário adequado ao negócio
Existem diferentes tipos societários, da sociedade limitada até a sociedade por ações. A análise do melhor modelo para a sua empresa deve considerar seu enquadramento ao Marco Legal das Startups (Lei Complementar n.º 182/21), em qual setor regulado (indústria, comércio ou serviços) ela estará inserida e, consequentemente, a que autoridade (órgão regulatório) estará sujeita.
2. Compreenda a legislação aplicável ao negócio
Ao avaliar a legislação aplicável, você identifica eventuais barreiras de entrada no mercado. Assim, confirma se os produtos e os serviços que serão oferecidos precisam ou não de algum tipo de autorização, registro ou licença específica da autoridade competente.
3. Faça uma avaliação da estrutura do negócio
A terceira etapa consiste em uma avaliação mais técnica do negócio e da sua modelagem e estrutura. A depender do setor, a regulamentação é complexa e apresenta uma série de restrições à atuação e operação das empresas reguladas.
4. Conheça as obrigações relacionadas aos seus produtos
Em seguida, é importante identificar as obrigações pós-registro do produto (inclusive no que se refere à informação e comunicação) e/ou a emissão de autorização de funcionamento. No setor regulado de saúde, algumas alterações e mudanças precisam ser comunicadas à agência reguladora sob pena de incidência das sanções legais cabíveis.
5. Conheça as principais penalidades
E, por fim, a quinta etapa incide na verificação das principais penalidades, isto é, os riscos regulatórios em caso de descumprimento da legislação aplicável.
Principais aspectos da regulamentação: barreiras de entrada e riscos
Inicialmente, vale ressaltar que tanto a ANVISA quanto a ANS não fazem grandes distinções na regulamentação para empresas de diferentes portes. Na maioria das vezes, essas agências reguladoras estabelecem exatamente as mesmas exigências, requisitos e obrigações para empresas de pequeno, médio e grande portes.
O tamanho da empresa é levado em consideração na dosimetria da sanção em caso de descumprimento das obrigações regulatórias.
Regulamentação da ANVISA
A Lei de Criação da ANVISA (Lei n.° 9.782/1999) estabelece que a agência é competente para regulamentar, controlar e fiscalizar os produtos e os serviços que envolvam risco à saúde pública. O art. 8 § 1º da referida lei, por sua vez, elenca uma relação longa de bens e produtos submetidos ao controle e à fiscalização sanitária pela agência, dentre eles:
- Medicamentos de uso humano, suas substâncias ativas e demais insumos, processos e tecnologias;
- Alimentos, inclusive bebidas, águas envasadas, seus insumos, suas embalagens, aditivos alimentares, limites de contaminantes orgânicos, resíduos de agrotóxicos e de medicamentos veterinários;
- Cosméticos, produtos de higiene pessoal e perfumes;
- Saneantes, equipamentos e materiais médico-hospitalares, odontológicos e hemoterápicos e de diagnóstico laboratorial e por imagem.
Assim, se a healthtech em questão vai oferecer algum desses bens e produtos, a legislação da ANVISA deve ser avaliada a fim de identificar as autorizações necessárias para comercializar o produto.
Autorização de Funcionamento (AFE) da ANVISA
Nem todas as empresas que trabalham com os produtos acima elencados precisam de AFE da ANVISA.
A autorização é exigida de empresas que realizam atividades de armazenamento, distribuição, embalagem, expedição, exportação, extração, fabricação, fracionamento, importação, produção, purificação, reembalagem, síntese, transformação e transporte de medicamentos e insumos farmacêuticos destinados a uso humanos, produtos para saúde, cosméticos, produtos de higiene pessoal, perfumes, saneantes e envase ou enchimento de gases medicinais.
A RDC n.° 16/2014 é a principal norma que estabelece os critérios para peticionamento de AFE e Autorização Especial (AE) de empresas.
Penalidades aplicadas pela ANVISA
Em relação aos riscos, a Lei n.° 6.437/1977 dispõe sobre todas as infrações à legislação sanitária federal, bem como as sanções aplicáveis e os critérios de aplicação. Ela apresenta um rol de 14 penalidades aplicáveis que variam desde advertência, multa, apreensão, inutilização e interdição do produto até cancelamento do registro do produto e da autorização de funcionamento da empresa e interdição parcial ou total do estabelecimento e suspensão de vendas e/ou fabricação de produto.
Vale lembrar que a ANVISA também fiscaliza a propaganda de diversos produtos regulados. Portanto, existem penalidades específicas para infrações às regras de propaganda, como proibição ou suspensão da publicidade e imposição de mensagem retificadora.
Regulamentação da ANS
A ANS, por sua vez, é o órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantem a assistência suplementar à saúde. Compete à ANS, dentre outras funções, autorizar o funcionamento de operadoras de planos de saúde (que visam a assistência médica, hospitalar e odontológica) e administradoras de benefícios, além do registro dos planos privados de assistência à saúde.
As empresas que pretendem atuar no setor de saúde suplementar têm de ter em mente que o arcabouço regulatório é um dos mais complexos e a fiscalização da ANS é constante.
O dever de informar a ANS é periódico, assim, está entre as obrigações acessórias o envio do Documento de Informações Periódicas das Operadoras de Planos de Assistência à Saúde (DIOPS/ANS), instituído com a finalidade de coletar informações cadastrais e financeiras para acompanhar a saúde econômico-financeira das operadoras e a manutenção dos dados cadastrais.
Penalidades aplicadas pela ANS
A Resolução Normativa (RN) n.° 489/2022 dispõe sobre a aplicação de penalidades para as infrações à legislação dos planos privados de assistência à saúde. Tal norma apresenta penalidades não só para empresa, como também aos seus administradores, membros de conselhos administrativos, deliberativos, consultivos, fiscais e assemelhados. Isso é um diferencial desse setor, a ANVISA, por exemplo, não apresenta penalidades desta natureza.
Entre as penalidades aplicáveis às pessoas físicas responsáveis estão:
- Suspensão de exercício do cargo;
- Inabilitação temporária para o exercício de cargo em qualquer operadora de planos de assistência à saúde; e
- Inabilitação permanente para exercício de cargos de direção ou em conselhos de qualquer operadora, bem como em entidades de previdência privada, sociedades seguradoras, corretoras de seguros e instituições financeiras.
O sucesso da startup começa desde a sua idealização
Embora seja comum que muitas startups surjam no mercado com pouco ou nenhum investimento inicial, é essencial, em especial para as empresas do setor de saúde, separar um montante inicial para avaliar a viabilidade regulatória do projeto.
A aplicação de recursos no estudo da viabilidade de soluções inovadoras é uma providência necessária e responsável não apenas para cumprir com a regulamentação aplicável, mas sobretudo para prevenir riscos aos sócios fundadores, investidores e usuários da solução que será oferecida no mercado.
O sucesso do empreendimento está diretamente ligado à sua capacidade de atender a determinada carência do mercado de forma escalável e sustentável, mas em hipótese alguma poderá se afastar dos limites regulatórios aplicáveis. Conhecer, aprender e se preparar para as regras do setor regulado de saúde é um dos pilares que sustentarão a estrutura de sucesso da healthtech.
Leia também: Escassez de investimentos em startups: o que dizem os especialistas do Disrupt?
*Daniel Caramaschi é sócio nas áreas de Contratos Comerciais e Negociações, de Fusões e Aquisições e de Societário do Demarest, além de coordenador do Disrupt, iniciativa que atende o segmento de startups no escritório.
**Monique Guzzo é advogada das áreas de Life Science e de Direito Público e Regulatório do Demarest.
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