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Lei estabelece novas regras de preços de transferência

16 de junho de 2023

Foi publicada nessa quinta-feira, 15 de junho de 2023, a esperada Lei nº 14.596, de 14 de junho de 2023 (“Lei nº 14.596/23”), que altera as regras de preços de transferência (“TP”) para fins de apuração do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (“IRPJ”) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (“CSLL”).

A Lei nº 14.596/23 é produto da conversão da Medida Provisória nº 1.152/2022, editada no fim de 2022, e entrará em vigor a partir de 1º de janeiro de 2024, com opção facultativa a partir de 2023.

As regras de TP estabelecem valores mínimos de receita tributável e máximos de despesas dedutíveis (“Benchmark”) para fins de apuração do IRPJ/CSLL em relações envolvendo partes relacionadas e partes que se beneficiam de tratamento tributário mais benéfico.

A legislação brasileira de TP atualmente vigente, sistematizada na Lei nº 9.430/1996, era bastante criticada por divergir da prática internacional adotada por muitos países. Essa legislação, inclusive, gerou inúmeras discussões nos Estados Unidos (EUA) em matéria de compensação do imposto de renda pago no Brasil.

O novo regramento reformula a sistemática atual, abandonando o cálculo do Benchmark com base nas margens fixas em prol dos testes de comparabilidade, que consagram melhor o princípio do “arm’s length”. Esse princípio estabelece que o cálculo do Benchmark deve considerar as relações praticadas entre partes independentes em transações passíveis de comparação.

As novas regras de TP são aplicáveis para operações com partes relacionadas, partes residentes ou domiciliadas em país que não tribute a renda (ou que a tribute com alíquota máxima inferior a 17%), ou que se beneficie de regime fiscal privilegiado. Contudo, foi ampliada a definição de “parte relacionada” para incorporar todas as partes cuja relação de influência possa impactar os preços praticados nas operações. A legislação também estabelece um rol de pessoas que se presumem ser relacionadas, como no caso de controladas e controladoras.

Em termos de aplicação, o regramento permanece baseado na determinação da operação controlada e na sua comparação com o Benchmark para identificar a necessidade de ajuste na apuração do IRPJ/CSLL.

A operação controlada será delineada com base na análise dos fatos e das circunstâncias da transação, além das evidências da conduta efetiva das partes. O novo regramento permite, inclusive, desconsiderar ou substituir a operação controlada, quando se concluir que partes não relacionadas não teriam realizado a transação controlada conforme delineado.

Já a análise de comparabilidade será realizada com o objetivo de comparar os termos e as condições da transação controlada, conforme seriam estabelecidos entre partes não relacionadas. Deve-se considerar uma série de fatores, entre eles as características economicamente relevantes das transações, bem como a seleção do método mais apropriado e do indicador financeiro a ser examinado. Os seguintes métodos devem ser considerados:

Novas Regras – Lei nº 14.596
Exportação e Importação
PIC – Preço Independente Comparável
PRL – Preço de Revenda menos Lucro
MCL – Custo mais Lucro
MLT – Margem Líquida da Transação
MDL – Divisão do Lucro
Outros métodos, conforme regulado pela RFB

O novo regramento altera o paradigma dos métodos utilizados para definir o Benchmark. Há uma preferência e recomendação pela aplicação do PIC, que considera a comparação com os preços ou os valores das contraprestações de transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas.

Ainda, os demais métodos agora seguem a análise de comparabilidade, abandonando-se as margens fixas do sistema prévio à Lei nº 14.596. Há, inclusive, previsão para utilização de outros métodos, o que não era permitido até então. Outro ponto de mudança é que, se antes o contribuinte poderia escolher o método mais favorável, com as novas regras ele deverá utilizar aquele mais apropriado para chegar-se a um resultado alinhado com o princípio “arm´s length”.

Caso a comparação resulte na necessidade de ajuste, a Lei nº 14.596/23 passou a prever expressamente duas alternativas ao contribuinte:

(a) ajustar diretamente a sua apuração do IRPJ/CSLL (“Ajuste Espontâneo”); ou

(b) ajustar o valor das transações até o fim do ano-calendário (“Ajuste Compensatório”).

Em caso de discordância, a Receita Federal do Brasil (“RFB”) pode estabelecer um ajuste diferente na apuração do IRPJ/CSLL (“Ajuste Primário”). A Lei nº 14.596 não trouxe o ajuste secundário, previsto pela Medida Provisória nº 1.152/2022.

Em complemento, podemos destacar outros pontos relevantes:

  • Ativos intangíveis: passam a ser expressamente objeto de controle de preços de transferência.
  • Regras Especiais: as regras trazem orientações específicas para transações envolvendo:
    • serviços intragrupo;
    • contratos de compartilhamento de custos;
    • reestruturação de negócios;
    • operações financeiras, incluindo contratação de dívidas e operações de tesouraria, bem como contratos de seguro e de garantia.

As regras podem gerar impactos sobre estruturas atuais de rateio ou compartilhamento de despesas e fianças e outras formas de garantia prestadas intragrupo.

  • Documentação e penalidades: a RFB disciplinará a forma pela qual serão prestadas as informações sobre a entrega ou a disponibilização dos documentos. Na falta de entrega de documentos, será aplicável multa com valor mínimo de R$ 20 mil e máximo de R$ 5 milhões, sem prejuízo do ajuste primário efetuado pela autoridade. Caso a autoridade fiscal discorde dos ajustes indicados pelo contribuinte em sua Escrituração Contábil Fiscal (ECF), permanece vigente a opção pela sua retificação, sem que disso resulte penalidade. 
  • Dispensas e flexibilização: serão reguladas pela RFB as hipóteses de dispensa ou flexibilização para conferir praticabilidade às normas. Está em discussão se isso poderá resultar na opção pela aplicação de margens fixas, conforme opção do contribuinte.
  • Procedimentos: as novas regras também trazem a possibilidade de realização de processos de consulta, além de procedimentos amigáveis com outros países.
  • Royalties e pagamentos por assistência técnica: foram revogados os antigos limites de dedutibilidade dos royalties, sendo que não serão mais dedutíveis os valores de royaltiese assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante devidos a partes relacionadas, quando a dedução dos valores resultar em dupla não tributação.

A equipe de Tributário do Demarest está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos adicionais que se façam necessários sobre o tema.